17/03/2014

Caminhando com Jesus na Terra Média

Frt. Matheus R. Garbazza, sdn

Espiritualidade é uma palavra que pode ter significações muito diferentes para pessoas diferentes. Mesmo entre aqueles que seguem uma mesma tradição religiosa, a sua prática e o seu efeito podem ser entendidos por vias distintas. Mas de um modo geral, a espiritualidade cristã pode ser compreendida dentro de uma categoria ampla e ao mesmo tempo precisa, a do seguimento de Jesus Cristo ou, em outras palavras, da imitação de Jesus Cristo. Dentro dessa categoria conseguimos observar muitos valores da autentica espiritualidade cristã, desde o seu foco maior, o próprio Jesus, até os meandros práticos para colocar em ação a vida espiritual: a própria prática de Jesus.

A busca da perfeição e da santidade não são realidades estáticas, mas sempre exigem um dinamismo e uma constante busca da parte daquele que se propõe a alcançá-las. A partir dessa constatação, essas realidades exigem um “caminho em dinamismo progressivo e contínuo. O conceito de seguimento vem ao encontro dessa visão dinâmica da vida espiritual tomada em seu aspecto de crescimento” (F. Ciardi).

A vida é assim entendida como um permanente devir, que exige atenção diária às novas realidades que a cada dia se manifestam. É preciso, pois, saber reagir às situações concretas com um olhar sempre novo – como nos inspira o Cristo. Esse paradigma da vida como caminho, peregrinação, marcha é muito sugestivo para a espiritualidade, não só cristã mas também de outras tantas tradições religiosas e mesmo éticas. É o que podemos comprovar com tantas narrativas (históricas e ficcionais) a respeito de caminhadas, viagens e jornadas - desde os clássicos greco-romanos até aos atuais cartuns.


São Josemaría Escrivá
Nesse sentido, a título de exemplo, a obra-prima espiritual de São Josemaría Escrivá denomina-se, precisamente, “Caminho”. Os pequenos pontos do livro apontam para o contínuo recomeçar que a vida em Cristo exige, e a necessidade da constante purificação interior para superar as dificuldades do dia a dia sempre com um vigor espiritual renovado.

Na literatura também podemos encontrar diversos exemplos de viagens que partem desse senso humano de incompletude. Afinal, toda jornada almeja um desfecho, um objetivo. Enquanto não se chega, a viagem está sempre aberta a novas reviravoltas (metáfora perfeita da vida humana). A partir dessas viagens literárias podemos tecer uma gama muito ampla de interpretações e abordagens, seja a partir da ética, da teologia, da filosofia, da crítica social, entre muitas outras.

Nosso objetivo aqui será ilustrar, a partir da literatura, a vida espiritual cristã a partir da categoria do seguimento de Jesus Cristo. O próprio conceito de seguimento aparece, como já aludimos anteriormente, como dinâmico, processual, sempre suscitando novas energias e novas forças. Para tanto, vamos utilizar um dos grandes clássicos da literatura universal, o romance O Senhor dos Anéis, publicado na década de 1950 pelo britânico John Ronald Reueu Tolkien. A história do livro trata justamente da viagem de Frodo Bolseiro e companheiros, a fim de destruir o Um Anel e assegurar o fim do império do Senhor das Trevas, Sauron.

Não se trata, evidentemente, de uma lista exaustiva a que vamos fazer. Tomaremos dez pontos da vida espiritual cristã, buscando entender como as intuições d’O Senhor dos Anéis nos ajudam a encará-los. Sabemos que uma espiritualidade forte não fica restrita entre as paredes dos templos, mas transborda para todos os demais aspectos da vida. Se encontrarmos, também nos lazeres e momentos culturais, amparo e estímulo para a prática cristã, encarnaremos melhor a espiritualidade cristã em nossa própria existência.

1) O próprio caminho

Dissemos que a vida cristã pode ser entendida a partir da experiência do seguimento de Jesus. Lendo os Evangelhos, verificamos que a existência terrena dele foi um constante peregrinar. Para tomar alguns exemplos de São Mateus: “Quando Jesus desceu a montanha” (8,1), “Então Jesus entrou no barco” (8,23), “Prosseguindo dali, Jesus foi à sinagoga” (12,9), “Ao passarem para a outra margem do lago” (16,5), “Quando chegaram a Cafarnaum” (17,24), “Jesus e os discípulos aproximaram-se de Jerusalém” (21,1). Essas e tantas outras viagens, Jesus as fez para comunicar a todos a suas palavras e a sua graça salvadora.

A experiência do caminho é abarrotada de conflitos e percalços: na viagem da Sociedade do Anel, vemos as dificuldades aparecerem a todos os momentos: rios, pântanos, montanhas, muralhas. Há perseguições, tentações. Há o constante risco de inimizades geradas mesmo entre aqueles que, pelo apoio mútuo, deveriam ser companheiros de jornada (basta observar, por exemplo, a desconfiança de Frodo em relação a Sam na parte final de sua jornada, antes de adentrarem a toca de Laracna).

A sociedade do anel
Ainda assim, a perspectiva de um caminho a ser feito nos enche de esperança: sabemos que sempre é possível recomeçar, encontrar novas forças, superar as dificuldades. O que importa é manter o foco. Deus confia que cada um de nós é capaz de fazer esse caminho. O pobre Frodo, pequeno e inexperiente, recebeu a missão mais importante de todas. Do mesmo modo cada ser humano recebe de seu criador o dom da própria vida – para tutelar e fazer frutificar. É como o administrador do Evangelho que confia aos empregados os seus talentos (Cf. Mt 25,14ss).

2) O objetivo

Nada na vida move mais que um grande ideal. Mesmo entre aqueles que se prendem aos ideais puramente materiais e humanos, não se abrindo à espiritualidade, esse é um fato facilmente verificável. Para conquistar o que quer que seja, as pessoas são capazes de fazer inclusive grandes sacrifícios.

Na trilogia de Tolkien, percebemos esse grande valor do objetivo final. Mesmo que não houvesse esperança para os próprios envolvidos nos acontecimentos, os personagens se movem com grande força e coragem para conseguirem vencer a Guerra do Anel a fim de garantir para as gerações futuras um lugar tranquilo e pacífico para se viver. O melhor exemplo é o do próprio Frodo, que não via possibilidade de salvar a terra para si próprio – mas ainda assim caminha até o final.

Quanto mais nós, que almejamos um dia reestabelecer a comunhão plena com Deus na eternidade! Deveríamos ser capazes dos maiores heroísmos para conquistar o que Paulo chama de “coroa imperecível” (Cf. ICor 9,25). Mesmo que saibamos que muitas vezes esses heroísmos são aqueles do dia a dia, nas nossas tarefas mais simples. Mesmo essas – ensinam os santos – devem ser feitas com amor sobrenatural. Servirão, assim, para nossa própria santificação. E sabemos bem que isso exige de nós muita paciência e força de vontade, virtudes que vamos adquirindo no decorrer de nossas vidas.

3) Formação pessoal

Quando visamos esse grande objetivo de nossas vidas que é encontrarmo-nos com Deus na eternidade entendemos que isso passa pelo esforço contínuo em fazer a cada dia a vontade de Deus. Enquanto buscamos a realização dessa vontade do Criador em nossa existência, vamos aprendendo aos poucos outras tantas coisas necessárias à nossa própria formação. Cada um de nós precisa fortificar o próprio caráter: é um fato que ninguém nasce pronto. Com a convivência, os estudos, as experiências, vamos adquirindo qualidades e mortificando defeitos, o que nos faz ser pessoas melhores não somente diante de Deus mas também perante toda a sociedade.

Tolkien nos oferece exemplos magistrais disso: no início de sua história, vemos os jovens Peregrin e Meriadoc acompanharem seu amigo Frodo por simples curiosidade pueril. Não possuem nem noção dos perigos que estão prestes a enfrentar, nem a seriedade da missão que estão abraçando. Ao longo do caminho, entretanto, vão tomando consciência dos rumos que escolheram. As dificuldades que vão se impondo a eles os levam a tomar cada vez atitudes mais maduras, observar bem suas escolhas e ponderar com sabedoria – cientes agora de que um pequeno deslize acarretará em consequências ruins não só para eles mas para todos os que os circundam. Vemo-los, então, dialogar com Barbárvore e os ents com grande coragem, a fim de expurgar Saruman de Isengard e assim garantir uma vitória para o seu lado. Ao final das contas, são aclamados com grande honra por Rohan e Gondor.

É com o passar do tempo, portanto, que cada um vai tirando da vida as lições para sua própria existência: desde os pais de família que vão aprendendo como cuidar dos filhos, passando pelo vagaroso aprendizado da infância, pelas escolhas da juventude, pelos estudos acadêmicos, pelo trabalho cotidiano até a tranquilidade da velhice. Trata-se da aquisição da “estatura de Cristo” de que fala São Paulo (Ef 4, 12-13).

4) Dificuldades no caminho

Todos sabemos que, qualquer que seja a escolha que façamos na vida, tal caminho sempre apresentará dificuldades. Coisa similar acontece com o discípulo que se propõe ao seguimento de Jesus. O Divino Mestre já alertava que mesmo aqueles que edifiquem sua casa sobre a rocha terão que fazer a experiência da tempestade e do vento (Cf. Mt 7,25).

A solidão é uma dessas dificuldades. N’O Senhor dos Anéis, vemos o protagonista, Frodo, sentir-se sozinho uma porção de vezes: em Bri, nas passagens de Moria após a queda de Gandalf, nas cataratas de Rauros – quando toma a decisão de se separar de seus confrades. É uma experiência difícil de ser superada, e que nos encontra quando menos nos esperamos. Também o Redentor experimentou isso antes de ser entregue aos judeus (Cf. Mc 14,27).

Muitas vezes essa experiência da solidão se prolonga no tempo e na intensidade, e então muitos passam pelo que os místicos nomeiam “noite escura”. É o que Sam experimenta quando acredita que Frodo está morto. Considera que está plenamente só, que mesmo a luz o abandonou, chega a pensar em deixar-se morrer – falta-lhe a certeza do objetivo a cumprir. Mas de novo ergue-se quando entende que ainda há o que fazer, que ainda resta um fiapo de esperança. E assim parte novamente. Numerosos santos e santas da Igreja tiveram essa mesma experiência.

É possível viver também desvios no caminho. Sejam eles provocados por outros ou procurados por nós mesmos (lembremo-nos do exemplo célebre de Santo Agostinho, que antes da conversão procurou caminhos muito tortuosos). Merry e Pippin experimentam o afastamento de seus amigos, sendo forçados a prosseguirem por outras sendas, antes inauditas. Passam por momentos de dor e desolações, tragados pelas trevas. Mesmo assim, após vencerem esse primeiro momento de dificuldades, tomam novo fôlego e acabam tirando proveito desse percalço do destino. O mesmo pode ocorrer com nossa vida espiritual.

5) Tentações

Há sempre um agente externo que tenta os caminhantes, procurando a todo custo fazê-los mudar de caminho e entregar-se a outras atividades que impedem a realização daquele objetivo maior que deveria movê-los. A Bíblia o chama de “Inimigo”, “Enganador” ou, meramente, “Tentador”. N’O Senhor dos Anéis temos a presença de Sauron, o Senhor do Escuro, que quer a todo custo desviar a sociedade do anel de seu caminho para então capturar o Um Anel.

Para além dessa figura do tentador, que certamente deve ser combatida a cada passo, temos que estar conscientes de que para cada vez que se cede à tentação há um assentimento interno do coração. Ou seja, só cai em tentação quem primeiro a vive interiormente. Vemos isso claramente com os irmãos Boromir e Faramir: o primeiro, totalmente entregue aos maus desejos (ainda que enganado sob o véu das boas intenções, veja bem), cai na tentação de cobiçar o Anel só para si. Acaba gerando sofrimento para si mesmo e para os seus confrades. Já seu irmão, colocado sob a mesma situação e com poderes ainda maiores (pela lei, poderia fazer com Frodo o que bem entendesse) não cede interiormente ao desejo egoísta de possuir o poder. Deixa que o Portador siga seu caminho, contribuindo para o bom desfecho da história.

Lição para o caminhante com Jesus: as tentações virão, isso é um fato. A luta diária (e quão dura ela é) consiste em resistir interiormente a essa tentação, para que ela não vença a vontade e domine nossas ações.

6) Presença do ancião

Gandalf na interpretação de Ian McKellen
no filme O Senhor dos Anéis
É recorrente que haja uma pessoa mais velha a guiar o caminho. Aqui não há dúvidas: as pessoas que já experimentaram a estrada são mais capazes de dar as pistas mais exatas para que os outros posam trilhá-la bem. Na vida espiritual, temos o máximo exemplo do próprio Jesus, que percorreu primeiro o caminho da cruz para que pudesse ressuscitar. É a partir de si mesmo que ele pode convidar-nos a percorrer o mesmo caminho: “Se alguém quiser vir comigo, renuncie-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me” (Mt 16,24).

Há diversos exemplos similares, mesmo na cultura popular. Na obra que temos em tela, é evidente o exemplo de Gandalf: o mago vem de uma terra distante, aceita conviver com os mortais da Terra-Média, compartilha seus ensinamentos e os acompanha ao longo da jornada. Sendo mais ousados na comparação, Gandalf passa inclusive pela experiência da morte-ressureição, quando cai nas Minas de Moria para depois regressar como “o branco”.

Não é o próprio ancião quem faz o caminho pelas pessoas. Ele oferece as condições, orienta, introduz nos mistérios do mundo: mas é sempre o próprio indivíduo quem deve tomar a vida nas mãos e se decidir em prosseguir o caminho esperado. Na caminhada da Igreja contamos com a presença dos sacerdotes, tão acertadamente chamados “presbíteros” (do grego presbyterós), isto é, anciãos. São aqueles que fazem as vezes do próprio Cristo e recebem o grave encargo de conduzirem os demais irmãos nas vias da fé.

7) Hierofanias

Consideraremos por hierofaniaa manifestação de Deus na história pessoal de cada um. Evidentemente que as ciências da religião poderão aprofundar muito mais o termo, dilatando-o e adotando-o em outras acepções. Mas aqui, temos o interesse pelos momentos em que o indivíduo pode ter a firme certeza de que está sendo acompanhado por Deus, sentindo sua presença e experimentando grande consolação.

Podemos comparar esses momentos com os grandes “oásis” presentes na narrativa de Tolkien. Depois de longas jornadas sob o sol, a chuva e os olhares dos inimigos, a sociedade do anel se depara com lugares que bem poderíamos chamar de “santuários”, tamanha a força curativa e benfazeja. O maior deles, sem dúvidas, é Lothlórien – a terra élfica de Galadriel, a Rainha Branca. Ali os viajantes experimentam um momento profundo de alívio e até mesmo desligamento do mundo exterior e dos problemas. Recarregam suas forças para prosseguirem sua jornada. O mesmo ocorre em Valfenda, Ithilien, Fangorn.

Sabemos bem disso: todo caminho também tem suas belezas, seus momentos de descanso, seus encontros alegres. Quem segue Jesus vê tudo isso pela ótica da fé: sabe distinguir em cada bom momento do caminho uma manifestação do Deus da vida, que quer que todos vivam em plenitude. E são esses momentos cheios da presença divina que nos alimentam para, mais tarde suportar os percalços vindouros.

8) Humildade

São Josemaría Escrivá apresenta um bom conceito de humildade: “Bem podias repelir esses pensamentos de orgulho; afinal, és como o pincel nas mãos do artista. E nada mais. – Diz-me para que serve um pincel, se não deixa trabalhar o pintor” (Caminho, 612). Pelas estradas da vida, vamos descobrindo que sozinhos não conseguimos progredir muito: sempre nos faltará algo. Precisamos uns dos outros para termos forças e suportar as fadigas do dia a dia. Desde as necessidades mais básicas, provenientes do corpo (alimento, água, vestuário) até as necessidades espirituais (amizade, amor, afeto). Ninguém vive sem o afeto dos que lhe são próximos.

Quem está cheio de si não caminha bem. Observando nossos exemplos d’O Senhor dos Anéis percebemos isso com clareza: basta observar a conduta de Saruman. O mago, antes o chefe de sua ordem, enche-se de si mesmo a ponto de pretender subjugar o próprio Senhor do Escuro. Pensa-se tão poderoso que nada lhe pode deter. Imerso em sua vaidade, embriagado pelo poder, esquece-se de seus próprios vizinhos ents. Acaba sendo engolido pelos próprios erros e pela própria soberba. Poderíamos mencionar ainda o exemplo trágico do rei Isildur que, com a chance única de destruir o Um Anel de uma vez, não o fez. Considerou-se forte o suficiente e se deixou levar pela ganância – levando assim a ruína para todos os seus descendentes. É a humildade de Aragorn, que a princípio hesita em assumir a coroa, que redime a casa real.

Também aquele que se propõe seguir a estrada de Jesus encontra-se sujeito a considerar-se muito elevado, muito sábio. Mas basta observar a vida do Redentor para perceber como ele, que é o caminho a verdade e a vida, fez-se um humilde servidor de todos: “Embora fosse de divina condição, Cristo Jesus não se apegou ciosamente a ser igual em natureza a Deus Pai. Porém esvaziou-se de sua glória e assumiu a condição de um escravo, fazendo-se aos homens semelhante” (Fl 2,6-7).

Certamente essa não é uma virtude fácil de ser adquirida. Exige esforço quase sobrenatural. Fere a vaidade, faz doer os instintos mais profundos de cada um. Mas aí reside precisamente o seu valor: quando somos capazes de lutar conosco mesmos por amor de Deus.

9) Vigilância

Se há uma coisa que aprendemos com a leitura do romance de Tolkien é o valor constante da vigilância. Desde as cidades fortificadas até os peregrinos pelas trilhas do mundo, todos devem permanecer de olhos atentos às ciladas do inimigo. O preço da falta de vigilância é alto demais: pode custar a própria vida. Os hobbits do condado, seguros de que sua terra permaneceria imaculada por mais longos anos, abrandaram a vigilância e foram seduzidos pelas belas palavras de Saruman. Tornam-se assim escravos em sua própria pátria.

A orientação do Divino Mestre é clara: é necessário vigiar e orar constantemente para não cair nas tentações do caminho (Cf. Mt 26, 41). Quem mantém a guarda alta saberá enfrentar as condições adversas. Essa vigilância decorre, sem dúvidas, daquela formação pessoal que cada um vai adquirindo ao longo do tempo e que deve ser constantemente colocada em prática. A prudência, o sabemos desde a filosofia de Aristóteles, é uma virtude de suma importância para o reto proceder. Jesus também aponta para a vigilância quanto ao dia final: é preciso estar preparado, pois ninguém sabe o dia e a hora em que será chamado para junto de Deus (Cf. Mt 24,42).

Tal vigilância se desdobra, dessa forma, em externa e interna. É preciso manter a vigilância externa, quais as muralhas fortificadas de Minas Tirith ou do Abismo de Helm. Isso significa a prática daqueles exercícios próprios da ascese cristã, vividos no seu espírito autêntico: a guarda dos sentidos, prática da caridade, jejum, penitência, entre tantas outras formas. Já a vigilância externa diz respeito a cada um no mais íntimo de sua consciência, esse santuário elevado do encontro consigo mesmo e com Deus. É preciso purificá-la cada vez mais, a fim de que esteja afinada com o projeto de Deus para cada um. É a advertência de São Paulo: “aquele que julga estar firme, cuide-se para que não caia!” (ICor 10,12).

10) Experiência da ressurreição

A Páscoa de Jesus será também a nossa páscoa. Isso significa que todas as misérias humanas, contra as quais precisamos batalhar cotidianamente, serão enfim transformadas e poderemos viver a vida divina. Páscoa leva à mente, quase de imediato, essa categoria da transformação, da superação da realidade limitada e limitante.

Ao final da Guerra do anel, enquanto tantos outros personagens devem continuar o seu caminho, pois sua missão no mundo ainda não se completou, vemos alguns outros partirem para as Terras Imortais, nas quais não haverá mais tristeza ou dor. Bilbo, Frodo, Gandalf e os demais agora tem a certeza de que sua carreira está terminada, que chegaram ao final do caminho. Sua força de vontade foi recompensada: “aquele que perseverar até o fim será salvo” (Mt 24,13).

Já não há mais um objetivo a cumprir, não mais esperança do que vira: a vida plena agora é uma realidade. Como diz São Paulo aos Coríntios: a fé e a esperança já não são mais necessárias, pois agra resta a visão perfeita daquilo que antes contemplávamos como num espelho. Agora, permanece o amor (Cf. ICor 13,12-13).

Ao longo do caminho

Prezado leitor, evidentemente essas linhas são apenas ilustrativas. Destacamos alguns pontos desse caminho com Jesus para melhor meditar sobre eles do ponto de vista de quem aprecia as histórias ficcionais. É um passo para que possamos observar os valores cristãos nas obras culturais que nos cercam: desde o início, já com a geração apostólica, a Igreja sempre se esforçou por encontrar as “sementes do Verbo” nos produtos da reta razão. Da mesma forma como há muitas coisas nocivas por aí, existem também boas referências cristãs.

O importante de tudo isso é que cada um possa levar firme esse propósito de colocar-se no seguimento de Jesus, esforçando-se por ser sinal de sua presença salvadora no mundo. Que a Virgem Maria, a Estrela Vespertina, tal como a Elbereth dos elfos, nos ilumine a todos e seja nossa constante guia nesse caminho difícil mas gratificante da Sequela Christi.


Matozinhos, 16 de março de 2014
Domingo II da Quaresma

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Para citar este artigo:

GARBAZZA, Matheus Roberto. Apostolado Caritas Fidei. Caminhando com Jesus na Terra Média. Disponível em: http://caritasfidei.blogspot.com.br/2014/03/caminhando-com-jesus-na-terra-media.html , desde 17/03/2014.

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